segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Te amo, robô

David Levy, pesquisador britânico de inteligência artificial e estudioso da relação entre homem e máquina, fez uma previsão controversa: o casamento de pessoas com robôs será legal até 2050. Para que as máquinas sejam promovidas de condição no campo amoroso, elas terão que desenvolver habilidades de conversação e compreensão da fala.

Bonecas sexuais cada vez mais reais estão no mercado e a indústria tende a expandir à medida que os produtos forem comercializados a preços acessíveis. Em breve serão disponibilizados exemplares dotados de inteligência artificial, capazes de interagir com seus donos. Não será absurdo trocar outro ser humano pela relação com uma máquina.

Milhares de japoneses adquirem anualmente bonecas para fins eróticos. Em alguns casos, não passa de um fetiche; em outros, pasmem, há um sentimento de carinho envolvido. Muitos homens no Japão também têm namoradas virtuais. A taxa de natalidade no país é baixa e são previstos distúrbios demográficos nas próximas décadas.

Aos que supõem que Levy exagera ao apostar firmemente na capacidade que as máquinas têm de despertar o amor humano, ele responde que é realista. Algo me diz que o pesquisador tem razão. Mais individualista do que nunca, o homem high-tech pode perfeitamente se apaixonar por um robô. Tudo para não precisar suportar outra pessoa.

Você aceitaria ser trocado(a) por um robô?

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Renúncia à idolatria

"Crepúsculo dos Ídolos", obra gerada pelo célebre filósofo alemão Friedrich Nietzsche no longínquo ano de 1888, foi uma das leituras que enriqueceram o meu 2017. No livro, Nietzsche questiona as supostas conquistas da sociedade de sua época. Selecionei alguns trechos do "Crepúsculo", que abordam temas como política, moral, arte e beleza:

"Em todos os tempos os sábios fizeram o mesmo juízo da vida: ela não vale nada..."

"As razões pelas quais se chamou este mundo de um mundo de aparências provam, pelo contrário, sua realidade. Uma outra realidade é absolutamente indemonstrável."

"Cada partido compreende que interessa a sua própria conservação não permitir que se esgote o partido contrário; o mesmo ocorre com a alta política."

"Reduzir uma coisa desconhecida a outra conhecida alivia, tranquiliza e satisfaz o espírito, proporcionando, além disso, um sentimento de poder."

"O juízo moral tem em comum com o juízo religioso acreditar em realidades que não existem."

"Para que haja arte, para que haja uma ação ou uma contemplação estética qualquer, uma condição fisiológica preliminar é indispensável: a embriaguez."

"Só às almas mais espirituais, admitindo que sejam as mais corajosas, é dado viver as tragédias mais dolorosas: mas é por isso que estimam a vida, porque ela lhes opõe seu maior antagonismo."

"Em resumo, o homem se reflete nas coisas, tudo aquilo que espelha sua imagem lhe parece belo: o juízo 'belo' é sua vaidade da espécie..."

"O valor de uma coisa reside às vezes não no que se ganha ao obtê-la, mas no que se paga para adquiri-la — naquilo que custa."

"Primeiro princípio: é preciso ter necessidade de ser forte, caso contrário, nunca se chega a sê-lo."

Capa da edição publicada pela Escala.

segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

Nome de batismo

Há duas semanas, publiquei neste blog uma lista de potenciais crimes futuros feita por João Pereira Coutinho. Entre eles, havia o de imposição de gênero: os pais não poderiam mais identificar o gênero dos filhos se baseando no sexo biológico deles. Distinções entre feminino e masculino seriam eliminadas na linguagem e no vestuário, por exemplo.

Eis que surge a notícia, num grande jornal brasileiro, de que um casal de empresários batizou o seu filho com um nome de uma letra só: B. Isso mesmo, a segunda letra do alfabeto! Segundo eles, o nome abreviado foi escolhido para que a criança tenha o mínimo de influência social possível, inclusive no que diz respeito ao gênero.

Nomear alguém significaria colocar uma intenção e eles não queriam que o filho seguisse um caminho predeterminado. O garoto (ou garota, ou o que quiser) é portanto um espaço em branco, podendo explorar a sua personalidade. Que importância tem, afinal, o sexo biológico? Quanto a mim, estou mais satisfeito que nunca com o nome que ganhei.

Sou da época em que "B" era só uma letra do alfabeto. Estou velho.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Autêntica emoção

Será que existe algum amante
Estando pela paixão inebriado
Que possa então se conformar
Sem a posse do objeto amado?

A contemplação pode estimular
Mas só há história com o toque
Fazendo da ideia uma verdade
Coração em estado de choque

Preservo as cartas da moçoila
Não existe beijo para recordar
Cada um mantém o que pode
Ou inventa para se contentar!

Ela não crê em almas gêmeas
Só que tem uma irmã idêntica
Menina ainda pura, do interior
Minha emoção mais autêntica

Perdoe este pacato sonhador
Que não deslembra tão cedo
Conferindo que o amor por ti
É o seu mais íntimo segredo.

Sofrimento é um dos sinônimos registrados de paixão.



segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Crimes do futuro

Em sua coluna para o jornal Folha de S. Paulo, na última terça-feira (21/11), o brilhante escritor português João Pereira Coutinho discorreu sobre o obsessivo controle dos comportamentos dos cidadãos por parte do Estado e o consequente aumento do número de condutas passíveis de punição legal. Com a habitual ironia, mas sem descompromisso com  a realidade, imaginou cinco potenciais crimes que as futuras gerações terão receio de cometer:

1) Crime de imposição de gênero
Os pais deverão abster-se de identificar o gênero dos filhos tomando como referência o sexo biológico dos mesmos.

Durante os primeiros 16 anos de vida da descendência, as tradicionais distinções entre "feminino" e "masculino" serão abolidas —na linguagem, no vestuário, nos brinquedos, até na onomástica. "Ele" e "ela", por exemplo, darão origem à palavra "el@" (pronunciada "el-arroba", como em "El-arroba já voltou da escola?").

2) Crime de ódio privado
Qualquer cidadão que expresse preconceitos raciais, sexuais, culturais ou religiosos em privado poderá conhecer denúncia se alguma testemunha entender fazê-lo. Com a evolução tecnológica, os apartamentos serão obrigatoriamente equipados com sensores antiódio, bastante semelhantes aos sensores antifumo, diretamente conectados com a delegacia do bairro.

3) Crime de apropriação cultural
Serão severamente punidos os cidadãos que, alegando interesse cultural ou razões artísticas, se apropriem de práticas e temáticas de um grupo étnico a que não pertencem. (Exemplos: caucasianos preparando sushi; escritor asiático publicando romance sobre personagem negro).

4) Crime de envelhecimento público
Com os avanços da medicina, será intolerável que um cidadão recuse tratamentos/cirurgias para ocultar/reverter o seu processo de envelhecimento, exibindo em público as marcas da decadência física e/ou neurológica. A imposição da velhice à sociedade será equiparada a um ato obsceno.

5) Crime de interesse sentimental não solicitado
Será punido qualquer adulto que manifeste interesse sentimental não solicitado por outro adulto —através de sorriso, elogio, convite para jantar etc.

O interesse sentimental de um adulto por outro será mediado por um advogado que apresentará ao advogado da parte desejada as intenções do seu cliente. Só mediante autorização da parte desejada é que o proponente poderá avançar para contato telefônico ou digital.

Qualquer outro ato sentimental que envolva "risco de intimidade" implica obrigatoriamente a presença de um tabelião.

Os velhos de amanhã terão que estar inteiros.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Recado aos artificiais

Não, não e não!
Não me venham com falsas solidariedades.
Dispenso todas as falas mecânicas,
Enfadonhas, assim como vocês.

Não quero ser nada.
Vocês, que querem-me um homem de ambição,
Fiquem sabendo que não tenho nenhuma.
Por que haveria eu de ter alguma?

Desgraçados todos estamos,
Condenados à morte desde o início.
Não tornem o percurso tortuoso.
Que tal uma saudação ao vazio?

Por favor, evitem me procurar.
Estaria eu presente se quisesse!
Se me ausento, é por indiferença.
Tanto faz tudo isso...

Bons samaritanos:
Por que tão entediantes?
Que erro é ser muito correto.
Deixem-me aqui em paz!

Engulam o entretenimento barato,
Assistam às exibições mais chulas,
Mas não contem comigo!
Eu preciso estar só. 

Longe de mim com esses rostos variados!

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Algo a mais

Quanto mais as previsões acertam
Portas de singularidade se fecham
Quem conhece antes o outro lado
Vê o de cá com menos desagrado

Se as nossas andadas são triviais
Talvez precisemos de algo a mais
Para eliminarmos os prognósticos
De convívios um tanto distópicos

A mão que inventa também ataca
O licor empolgante causa ressaca
Perdão pela carência de otimismo
Dispenso autoajuda e esoterismo

Procuro razão para ter esperança
Poder então desfrutar da bonança
Desconfiando até mesmo do ouro
Grana vira pó, o moreno fica louro

Muito difícil satisfazer o indivíduo
Extirpando qualquer mau resíduo
Porque o desejo empurra à frente
Assim como ele dá o nó na gente.


Se imagina um futuro melhor que agora até ele chegar.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Ofereço a minha vida

Jim Jones, natural do estado norte-americano de Indiana, foi o fundador e líder do movimento religioso Templo do Povo, inaugurado em 1955, que combinava elementos do cristianismo com ideais políticos socialistas. Jones arrendou um terreno em meio à selva da Guiana duas décadas depois e se mudou para lá com centenas de seguidores.

Jonestown, nome de batismo da comunidade, possuía um espaço para que os habitantes plantassem verduras e legumes, bem como uma escola para as crianças. Praticamente não havia contato com o mundo exterior. Dissidentes relataram que o líder promovia um regime ditatorial, marcado por punições severas e a presença de guardas armados.

Alegando que serviços de segurança americanos conspiravam contra o Templo, Jones orquestrou um suicídio coletivo de caráter supostamente revolucionário. No dia 18 de novembro de 1978, em Jonestown, mais de 900 pessoas morreram após a ingestão de veneno misturado a um ponche de frutas. O comandante também ceifou a própria vida.

Trago à tona o trágico ocorrido para levantar algumas questões pontuais: qual o limite do poder de um líder religioso? Até que ponto vale a pena batalhar pela defesa de convicções políticas? Se matar em nome de uma causa é uma atitude nobre ou um irremediável equívoco? Fiquemos ressabiados com as figuras messiânicas do nosso país.

Jonestown após o suicídio coletivo de novembro de 1978.

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Teste cego

Na década de 1980, a Pepsi lançou, como estratégia mercadológica, um teste cego no qual os consumidores experimentavam dois tipos de refrigerante sem saber de que marcas eram e elegiam o seu preferido. Ao final do teste, 57% dos participantes haviam achado a Pepsi melhor que a Coca-Cola.

A gigante Coca, preocupada com o resultado da pesquisa e a crescente participação de mercado da concorrente, adotou uma medida radical: mudou a sua fórmula e lançou a New Coke, com gosto mais adocicado. O novo produto teve uma péssima recepção pelo público e não demorou a sair de circulação.

Pesquisadores posteriormente constataram que o teste cego tinha validade questionável, haja vista que o sabor de um produto, quando associado à subjetividade da marca, é diferente. A Coca superaria a Pepsi em vendas, portanto, por causar um impacto maior na mente das pessoas, ainda que a rival possa ser mais gostosa.

A marca altera a nossa percepção de um produto.

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Grande rede

Adoro estar informado pelo Facebook
Ter conhecimento sobre tudo e todos
Atualizar a linha do tempo feito louco
Adicionar até mesmo desconhecidos

Converso o dia inteiro no WhatsApp
Chego a cansar de tanto que eu falo
Faço parte dos mais variados grupos
Vibra o aparelho e eu vou no embalo

No Instagram, exibo a minha alegria
Baita sorriso, praia e comida chique
Aqui a crise ainda não foi percebida
Me segurem, porque estou no pique

Viajo o mundo todo pelo Street View
Conheci Amsterdã, Londres e Berna
Como é bom ser um cidadão global
E isso que eu nem mexi uma perna

Sou membro efetivo da grande rede
A desconexão agora não é cogitada
Pertenço ao terreno com vida virtual
Me atrai qualquer telinha iluminada.


Estar fora da rede, atualmente, equivale a não existir.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Pseudointelecto

Cuidado com quem se diz intelectual
Gente assim é capaz de quase tudo
No casulo da hipotética inteligência
Indiferente aos problemas do mundo

Toda virtude real envolve a discrição
Somente quem é tolo se exibe à toa
Mas o outdoor do vazio está em alta
E a fase da mediocridade anda boa

Qualquer coisa se vende como arte
A mentes férteis, esterco de primeira
Tolerância só entre a própria classe
O povo lá fora fala bastante besteira

Fuja dos falsos pregadores do bem
Eles têm fetiche pelo autoritarismo
Pense muito para não pensar mal
Ideologia barata faz seu terrorismo.


A mentes férteis, esterco de primeira

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Maltratado com satisfação

Um estado psicológico peculiar me chamou a atenção assim que tive conhecimento dele: a síndrome de Estocolmo. É portador de tal síndrome quem, após estar exposto a um longo período de intimidação, passou a ter afeição pelo agressor. Vítimas de sequestro, escravos e pessoas submetidas à violência doméstica, por exemplo, podem desenvolvê-la.

São características marcantes desses casos a existência de uma relação envolvendo poder e coerção, bem como a ameaça de danos físicos ou morte. A vítima, com um extremo estresse físico e mental, começa evitando comportamentos que desagradem o seu algoz e termina interpretando os atos dele de não violência como indícios de suposta simpatia.

A síndrome é assim nomeada em referência a um assalto a banco que ocorreu em Estocolmo, capital da Suécia, em agosto de 1973. Na ocasião, quatro indivíduos feitos de reféns por dois assaltantes recusaram a ajuda da polícia e continuaram a defender os seus raptores mesmo quando libertos. O psiquiatra Nils Bejerot que cunhou o termo.

Ao contrário do que parece, a síndrome de Estocolmo não é tão rara. Um caso clássico diz respeito às mulheres que, mesmo sendo violentadas de diversas formas pelos seus parceiros, os protegem e até encontram justificativas para as agressões sofridas. Cada louco com a sua mania, haja vista que alguém sensato recusa quaisquer maus-tratos.

Talvez você conheça algum portador da síndrome de Estocolmo.

segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Fragmentos de amor líquido

Abaixo, alguns trechos extraídos do recomendado livro sobre a fragilidade dos laços humanos "Amor Líquido", do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, o qual faleceu, aos 91 anos de idade, em janeiro de 2017:

"Os filhos estão entre as aquisições mais caras que o consumidor médio pode fazer ao longo de toda a sua vida."

"Nos compromissos duradouros, a líquida razão moderna enxerga a opressão; no engajamento permanente percebe a dependência incapacitante."

"A solidão por trás da porta fechada de um quarto com um telefone celular à mão pode parecer uma condição menos arriscada e mais segura do que compartilhar o terreno doméstico comum."

"O desvanecimento das habilidades de sociabilidade é reforçado e acelerado pela tendência, inspirada no estilo de vida consumista dominante, a tratar os outros seres humanos como objetos de consumo e a julgá-los, segundo o padrão desses objetos, pelo volume de prazer que provavelmente oferecem e em termos de seu 'valor monetário'."

"O amor-próprio é construído a partir do amor que nos é oferecido por outros."

"A moral nada mais é que uma manifestação de humanidade inatamente estimulada — não 'serve' a propósito algum e com toda certeza não é guiada pela expectativa de lucro, conforto, glória ou autoengrandecimento."

"Os moradores das cidades e seus representantes eleitos tendem a ser confrontados com uma tarefa que nem por exagero de imaginação seriam capazes de cumprir: a de encontrar soluções locais para contradições globais."

"Toda aposta na pureza produz sujeira, toda aposta na ordem cria monstros."

"Além de representarem o 'grande desconhecido' que todos os estrangeiros encarnam, os refugiados trazem consigo os ruídos de uma guerra distante e o fedor de lares pilhados e aldeias incendiadas que só podem lembrar aos estabelecidos a facilidade com que o casulo de sua rotina segura e familiar (segura porque familiar) pode ser rompido ou esmagado."


"Amor Líquido", lançado no Brasil em 2004 pela Editora Zahar.

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Desvinculado

Caso Deus pareça estar distante
E fé nenhuma possa tranquilizar
Com a progressiva secularização
Existindo muito o que questionar

Na família não haja de fato união
Na qual morem juntos estranhos
Cumprindo com suas obrigações
Dividindo momentos enfadonhos

Se os amigos virarem conhecidos
Evitando ao máximo um encontro
Só restará guardar as lembranças
E então torcer que desponte outro

Relacionamento nenhum dê certo
Na busca desenfreada por alguém
Talvez o problema não fique longe
Ou a realidade seja mesmo aquém

Calma, você ainda terá uma saída
Saiba suportar a própria presença
Guie a si mesmo nessa penumbra
Pois solidão não pode ser doença.


Quem conta consigo mesmo não está completamente só.




segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Novidades do velho mundo

Abro a janela, enxergo o que passou
No horizonte, prédios cortam a visão
Um poderoso calor ofusca o inverno
Aquecimento global não é invenção

Se o amor é para sempre, tudo bem
Nada terminou sem motivo aparente
Ainda encontrarei uma alma comum
Para ter esconderijo além da mente

As placas direcionam ao precipício
À direita ou à esquerda há sangue
Jovens intolerantes são engajados
Não comovem disparos de tanque

Se nada for para sempre, tudo bem
Estamos adaptados à efemeridade
Amigos cabem nos bolsos da calça
Fácil descartar quando der vontade

Fui condenado à chatice moderna
Cumprirei a pena enquanto puder
Que novidades animam o mundo
Se são velhas diante do que vier?


Aprecie com moderação, pois a obsolescência é uma regra.


segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Poesia Doce

O projeto "Doce Poesia Doce", organizado pela Fundação Gregório de Mattos, de Salvador/BA, merece menção especial. De 17 de setembro a 8 de outubro, cerca de dez mil balas doces com poesias impressas embaladas serão distribuídas gratuitamente em escolas, praças, hospitais e postos de atendimento da capital baiana. 

Metade das "poesias doces" homenageará a obra de artistas consagrados da língua portuguesa, enquanto que a outra metade oportunizará que poetas de todo o Brasil divulguem o seu trabalho. O autor deste blog integrará o projeto com a poesia de sua autoria "Planeta metamórfico". Que imensa honra ter um espaço nisso!

O doce, tal como a poesia, estimula a querer de novo.

segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Ponto fora da curva

A Rússia é um país marcado por peculiaridades, como o costume do seu povo de beber vodka, o passado de potência socialista opositora ao capitalismo ianque e o prestígio que seu líder atual, Vladimir Putin, goza, adquirindo uma condição de semideus. Até mesmo no terreno virtual os russos são diferenciados, possuindo uma rede social própria.

O gigante Facebook, que chegou a dois bilhões de usuários em junho deste ano e é também dono dos populares Instagram e WhatsApp, está no topo da lista de páginas mais acessadas em praticamente todo o mundo. Não na Rússia. O VKontakte, rede social russa, supera até o Google no seu país de origem e é o site mais popular daquela terra.

O VK, lançado em 2006, apresenta funcionalidades bastante semelhantes às da rede de Mark Zuckerberg, contudo o Facebook sequer aparece entre as vinte páginas com maior número de visitantes da Rússia, de acordo com a Alexa Internet. Sem dúvida se trata de uma derrota expressiva do Face em uma das nações mais importantes do globo.

Me preocupa a proporção descomunal que o Facebook atingiu, monopolizando o mercado das redes sociais, afinal não possui nenhum concorrente à altura há um bom tempo. Optando pelo VK, os russos andam na contramão de uma tendência e revivem o sentimento da Guerra Fria. A Rússia curte, e sempre curtiu, o que ela bem entende.

Logotipo do VK, rede social que desbanca o Facebook na Rússia.

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Espírito esportivo

Ele nasceu humilde, no interior
Sempre foi tido como pequeno
Teve que comer pelas beiradas
Para que conquistasse terreno

Logo foi incentivado pela cidade
Começou a incomodar figurões
Uma zebra era seguida da outra
E ele avistava os altos escalões

Teve destaque por algum tempo
Mas não ganhou o maior troféu
Até ir gradativamente sumindo
Desesperando um ou outro fiel

Ainda existe, mas ninguém liga
É rejeitado no próprio município
Deve ter os seus cem anos hoje
E espírito esportivo de princípio.


Agora a população daquele local ignora quem ele foi.




segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Extremo retrocesso

De um lado, lideranças de partidos brasileiros de esquerda, tais como PT, PCdoB e PSOL, manifestaram apoio ao governo ditatorial de Nicolás Maduro na Venezuela. Maduro tem perseguido severamente os seus opositores, com mais de uma centena deles tendo sido mortos até aqui, além de a maioria da população estar na miséria.

Do outro, em Charlottesville, nos Estados Unidos, centenas de pessoas protestaram, animadas por ideais nazistas, contra grupos como judeus, negros e homossexuais. A chamada direita alternativa americana explica que visa proteger a coletividade branca dos seus supostos inimigos, os quais estão ganhando espaço. Uma insanidade. 

As duas informações são recentes e igualmente lamentáveis. Não há ideologia que justifique a defesa de modelos de governo ultrapassados e intolerantes como a ditadura e o nazismo. O extremismo, seja ele de esquerda ou de direita, é repugnante e deve ser combatido por meio da sensatez. Nós, humanos, precisamos evoluir muito ainda.


Alerta: a imagem não foi extraída de um livro de História.

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Tendências entre os jovens

Melhores condições materiais
E mais gente infeliz na Terra
Isso que pesquisas apontam
Para a megatecnológica era

O consumismo não satisfaz
Somente intensifica o vazio
Tudo possuir, mas nada ter
Ser refém de modo doentio

Vêm ansiedade, depressão
Tendências entre os jovens
Criados em berços de ouro
Contudo indivíduos pobres

Supostamente conectados
Quase não mais dialogam
Aflitos, cheios de angústia
Alguns até se matar topam

Chega de tanto fingimento
Quando o assunto é saúde
Poderíamos ter consciência
No entanto a gente se ilude.


Simular estar feliz potencializa a infelicidade.


segunda-feira, 7 de agosto de 2017

De corpo e alma

Na noite de 29 de julho, um sábado, o músico Humberto Gessinger, a voz e a alma dos Engenheiros do Hawaii, fez uma apresentação memorável no município de Farroupilha/RS. Os milhares de presentes nos Pavilhões da Fenakiwi, tradicional feira da Serra Gaúcha, saíram satisfeitos do show de um dos maiores artistas brasileiros.

As músicas tocadas foram, basicamente, as do álbum "A Revolta dos Dândis", o qual completa 30 anos de lançamento em 2017, e os maiores sucessos dos Engenheiros. Clássicos como "Infinita Highway", "Refrão de Bolero", "Era Um Garoto" e "Pra Ser Sincero" emocionaram o público, composto por pessoas das mais variadas idades.

Tirei um peso das costas ao ver o Humberto Gessinger, um dos meus poucos ídolos, ao vivo pela primeira vez. O nervosismo que me tomava horas antes do show desapareceu assim que o mesmo começou, cedendo espaço a uma incrível tranquilidade. Estar perto de alguém que admiramos, ainda que por tempo limitado, é imensamente gratificante.

"Não interessa o que o Estado diz
Nós falamos outra língua"

(O Exército de um Homem Só)

segunda-feira, 31 de julho de 2017

Área restrita

Todos deveriam ter o seu lugar
Um refúgio para as horas ruins
Um cenário aos largos sorrisos
Mais cômodo que os botequins

Pode ser em Paris, Nova Iorque
Banco do parque ou alto da laje
Contanto que o cantinho exista
E dê para ir com qualquer traje

Talvez seja um recanto interior
A quem não encontra paz fora
Discreto, mas ingrediente vital
Ao misantropo em sua aurora

Navegar com local a regressar
Se perder para então conhecer
Intuir antes de o desejo surgir
Na comunhão com essa região.


Mesmo um quarto quem sabe seja o mais incrível lugar.

segunda-feira, 24 de julho de 2017

À distância

Gosto do que imagino bom
Desde o gosto do bombom
Devido a isso fico frustrado
Quando é ruim o resultado

Me atraí por uma estranha
Vi ela num site, na manha
Ainda que falamos pouco
Assim eu não fiquei rouco

Ou será que só teclamos?
Estou viajando, hermanos
Trocando ao vivo e virtual
Desdenhando o que é real

Nunca namorei à distância
Mas não foi por implicância
Talvez antiquado eu esteja
Repelindo quem me deseja

Temo quebrar minha cara
Pagando caro por uma tara
Combinando de nos vermos
E achar ela mais ou menos

Te amo pois te desconheço
Deslembre o meu endereço
A admiração tem validade
Eu não quero cara-metade.


Te amo pois te desconheço

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Revelações nas recordações

"Existem nas recordações de todo homem coisas que ele só revela aos seus amigos. Há outras que não revela mesmo aos amigos, mas apenas a si próprio, e assim mesmo em segredo. Mas também há, finalmente, coisas que o homem tem medo de desvendar até a si próprio, e, em cada homem honesto, acumula-se um número bastante considerável de coisas do gênero. E acontece até o seguinte: quanto mais honesto é o homem, mais coisas assim ele possui." (Fiódor Dostoiévski, em "Memórias do Subsolo")

Será que o fato de não esclarecermos algumas questões delicadas a nós mesmos, evitando um mais profundo diálogo íntimo, por fim não acabe nos fazendo bem? Suspeito que sim. Descobrir demais pode ser um perigo. Outro ser humano é mais facilmente admirável por nós quando não o conhecemos muito. Talvez o apreço que nutrimos pela nossa própria pessoa se sustente nesse olhar descontado que insiste em permanecer sobre aquilo que fazemos.

O homem atormentado pelas lembranças quer parar de pensar.

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Garoto invisível

Charlie é um tanto esquisito
Não possui qualquer amigo
Jamais beijou alguma boca
E seguramente quer abrigo

Charlie foi parar no hospital
Após ter umas alucinações
Com a já falecida tia Helen
Que influíam nas emoções

Charlie tira sempre nota A
E começou o ensino médio
Conseguiu ele se enturmar
Saindo um pouco do tédio

Charlie experimentou amor
Quando foi por Sam olhado
Nunca havia sentido aquilo
E ficou por ela maravilhado

Charlie se imagina infinito
Ouvindo música na picape
Agora é capaz de participar
Sem recorrer a um escape.


"— Charlie, a gente aceita o amor que acha que merece."

(As Vantagens de Ser Invisível)

segunda-feira, 3 de julho de 2017

The e-book is not on the table

As tecnologias de download e streaming de músicas suplantaram os CDs, assim como jornais e revistas já atraem muito mais leitores às suas páginas na internet que às edições tradicionais. O bom e velho livro, tal como o conhecemos, estaria também com os dias contados com o advento do e-book?

De acordo com informações veiculadas no Correio Braziliense em junho de 2016, os livros digitais, no Brasil, ainda têm um caminho longo a ser percorrido. Eles representam apenas 3% da receita das grandes editoras, apesar de o número desses exemplares vendidos ter aumentado 4,2% entre 2014 e 2015.

A Folha de São Paulo informou, também no ano passado, que as vendas de livros eletrônicos ainda crescem no Brasil, mas não muito. Segundo o presidente do Sindicado Nacional dos Editores de Livros, Marcos da Veiga Pereira, nunca houve um progresso consistente dos e-books no mercado brasileiro.

Como um apreciador desde cedo do livro físico, não posso esconder que fico aliviado com os dados que dão conta de que a extinção do mesmo está longe de ocorrer. Os leitores apaixonados, em sua imensa maioria, não abrem mão do manuseio das obras. Que os e-books continuem sem incomodar.

Deixei paixões para trás, mas não sei se sobreviveria sem os livros.

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Combate ao debate

Até para pedir intervenção militar
É preciso liberdade de expressão
E há quem queira nova ditadura
O que escancara falta de noção

Um saudosista do que não viveu
Prega justiça nas mídias sociais
Vai insultando a torto e a direito
Espalhando o ódio sempre mais

Não existe debate, mas combate
Os "cidadãos de bem" são maus
Implacáveis com seus opositores
Seja em Porto Alegre ou Manaus

Desconhecem a discussão sadia
Desrespeitam outro ponto de vista
Fuzilam sem arma (por enquanto)
Mesmo quem está na zona mista

Tem pássaros voando pra gaiola
E o pior: não sou um comediante
Mas deixo escritos alguns versos
Afinal poderão me proibir adiante.


Os "cidadãos de bem" são maus